Sexta-feira, 23 de Março de 2018
Os Missionários Combonianos trabalham há vários anos em Boa Vista, no Brasil, acompanhando os povos indígenas de Roraima. Com a emergência dos imigrantes vindos da Venezuela, uniram-se às muitas forças da Igreja e da sociedade civil em acções voluntárias de solidariedade e de apoio ao povo venezuelano, tentando alimentar a sua esperança. Visitam regularmente os abrigos de acolhimento, sobretudo para apoiar no campo da saúde e da higiene. Leia a Carta à Sociedade Brasileira que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) publicou, com o objectivo de despertar a solidariedade e o apoio ao povo venezuelano, de denunciar a inoperância dos poderes públicos e exigir acções imediatas estruturadas de acolhimento e protecção aos imigrantes. Foto: Felipe Larozza.

A Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano (CEPEETH) da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), realizou entre os dias 1 e 4 de Março de 2018, nas cidades de Boa Vista e Pacaraima (RR), a missão “Fronteiras Brasil/Venezuela”.

Após a missão, o presidente da comissão enviou uma Carta aberta à sociedade onde relata da situação dos imigrantes venezuelanos que precisam de tudo, desde itens básicos de alimentação, higiene e saúde, até emprego e condições dignas de abrigo ou moradia.

“Esse cenário tão desolador nos interpela para acções e posicionamentos pessoais e colectivos de acolhida, solidariedade e incidência política de forma articulada em âmbito local, estadual e nacional. Por isso, em nome da CEPEETH fazemos um veemente apelo às igrejas e à sociedade a uma maior solicitude para com estes nossos irmãos e irmãs imigrantes e refugiados”, diz um trecho da carta.

Por causa da crise política, económica e social na Venezuela e pela proximidade das fronteiras, os imigrantes e refugiados entram no Brasil pelo município de Pacaraima, em Roraima. De lá, a maioria segue para Boa Vista, a menor capital em número populacional do Brasil.

No pequeno município o que se encontrou foi a fome, famílias e mulheres grávidas vivendo nas ruas, desnutrição, crianças fora da escola, insalubridade nos abrigos, e xenofobia.

“Nosso coração sentiu: profunda indignação diante dessa desumana e injusta realidade ao constatar a ausência e descompromisso dos poderes constituídos em dar respostas; de averiguar que a preocupação com a beleza das praças tem mais importância que o cuidado à pessoa humana; de escutar expressões discriminatórias em relação aos migrantes e refugiados e de entender o quanto nos falta para viver o Projecto de Deus que nos faz todos irmãos e irmãs”, diz outro trecho da carta.

O abrigo “Tancredão” é um ginásio de Boa Vista adaptado em regime de emergência para acolher os imigrantes venezuelanos. Há outro abrigo desse tipo na cidade. Absolutamente carente de infra-estruturas, o Tancredão está lotado de gente; sobram só estreitos corredores entre as barracas do acampamento e os colchões espalhados no chão. Na parte coberta, a fumaça da cozinha a lenha penetra nos pulmões das pessoas; na área externa, dezenas de tendas da defesa civil e outras dezenas de barracas estão cercadas de lama e água estagnada. As fossas dos banheiros entopem frequentemente e as crianças brincam descalças ao lado do esgoto a céu aberto.

Um dos líderes do acampamento venezuelano, confessa: “Com que coragem podemos impedir a entrada no abrigo de uma nova família que bate ao portão? A gente acolhe e busca um cantinho também para eles... mas aqui a cada duas pessoas que saem são dez que entram.”

Enquanto o acolhimento é o princípio vital da autogestão do abrigo, a exclusão e a apatia parecem ser a postura dos poderes públicos. É o que destaca com veemência a Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano da CNBB, que realizou uma missão de observação e solidariedade junto à fronteira Brasil-Venezuela: “situações graves de violação dos direitos e falta de políticas públicas elementares como alimentação, saúde, higiene, segurança, educação; denúncias de violência policial, violência contra a mulher, exploração sexual e do trabalho, tráfico de drogas e de pessoas e de completa omissão do poder público”, lê-se na carta dos bispos do Brasil.


Foto: Felipe Larozza.