O quinto domingo da Quaresma é uma preparação imediata para a Páscoa. No próximo domingo, celebraremos o Domingo de Ramos e será proclamado o relato da paixão e morte de Jesus. O evangelho de hoje, tirado de São João, pretende introduzir-nos no mistério que se aproxima, para que possamos vivê-lo, não como espectadores, mas como discípulos. É o próprio Jesus que nos revela o sentido do que está para acontecer.

Evangelho de São João 12, 20-23

Senhor, nós queríamos ver Jesus!

Jeremias 31,31-34; Salmo 50; Hebreus 5,7-9
João 12,20-33: “Chegou a hora!... Chegou a hora!”

O quinto domingo da Quaresma é uma preparação imediata para a Páscoa. No próximo domingo, celebraremos o Domingo de Ramos e será proclamado o relato da paixão e morte de Jesus. O evangelho de hoje, tirado de São João, pretende introduzir-nos no mistério que se aproxima, para que possamos vivê-lo, não como espectadores, mas como discípulos. É o próprio Jesus que nos revela o sentido do que está para acontecer.

Nós queríamos ver Jesus!

Estamos na última Páscoa do Senhor e imediatamente após a sua entrada “triunfal” em Jerusalém. A cidade estava cheia de peregrinos, vindos de todo o lado. A passagem do Evangelho fala de um grupo de prosélitos de língua grega que, ao ouvir falar de Jesus, desejavam vê-lo, ou melhor, conhecê-lo. Não sabendo o aramaico, falam com Filipe, que, por sua vez, fala com André. Os dois são os únicos do grupo dos Doze que têm um nome grego e que certamente sabem um pouco de grego. “Queríamos ver Jesus” é o seu pedido e a sua e nossa oração! Cada homem e mulher traz esta oração no mais íntimo do seu coração: “Procuro a tua face, Senhor” (Salmo 27,8). 

A salvação passa pelo olhar!

Todo o evangelho de João se desenrola entre o convite a ir ter com Jesus para ver: “Vinde e vede!” (1,39) e a experiência jubilosa dos discípulos: “Vimos o Senhor!” (20,25), concluindo com a bem-aventurança final: “Bem-aventurados os que não viram e acreditaram!” (20,29). Se na primeira Aliança o sentido da audição era o privilegiado na relação com Deus, na segunda Aliança é o da visão. Todo o evangelho de João é permeado pelo sentido da visão. Encontramos cerca de 150 palavras relacionadas com este sentido. Impressionante! Do “ver” e do “não ver” passa tanto o drama trágico e sombrio da história humana, como o rasto de luz, de alegria e de vida que a atravessa! A salvação passa através do olhar! A história começa com o olhar complacente de Deus sobre a sua criação, repetido sete vezes: “E Deus viu que era bom” (Génesis 1), e termina com o olhar contemplativo e extasiado do homem diante da nova criação: “E vi um novo céu e uma nova terra... E vi também a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do céu, da parte de Deus, preparada como uma noiva adornada para o seu esposo” (Apocalipse 21,1-2). Então, sim, acontecerá o que diz o Qohélet: “Os olhos não se fartarão de olhar, nem os ouvidos de ouvir” (1,8).

Filipe e André somos tu e eu!

Os homens e as mulheres de hoje procuram Jesus, de várias maneiras, até mesmo nos extravios nos caminhos dos sentidos. E dirigem-se a nós para o ver e conhecer. Mas nós temos dificuldade em compreender as suas perguntas porque não falamos a sua “linguagem”. Só vivendo imersos nesta humanidade, na sua cultura e história, nas suas esperanças e medos, poderemos interpretar a sua procura. A linguagem que eles entendem não é a dos sermões, nem a do catecismo, mas a dos sentidos e do testemunho. Só se nós próprios tivermos ouvido, tocado e visto o Senhor é que poderemos dizer-lhes: 
“O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que contemplámos e as nossas mãos tocaram do Verbo da vida - porque a vida se manifestou, nós vimo-la, e disso vos damos testemunho e vos anunciamos a vida eterna, que estava junto do Pai e nos foi manifestada -, o que vimos e ouvimos, anunciamo-lo também a vós, para que também tenhais comunhão connosco” (1Jo 1,1-3). 

Chegou a hora!... Chegou a hora!

A resposta de Jesus ao pedido dos gregos é bastante desconcertante: “Chegou a hora em que o Filho do homem vai ser glorificado. Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica só; mas se morrer, dará muito fruto... E quando eu for elevado da terra [na cruz], atrairei todos a mim”. Jesus já vê no pedido dos gregos os primeiros frutos da extraordinária fecundidade do “Grão de trigo”. Jesus viveu em vista desta “hora”, mas experimenta, também ele como nós, a perturbação e a angústia perante a perspetiva da sua morte iminente: “Agora a minha alma está perturbada. E que hei de dizer? Pai, salva-me desta hora? Mas por causa disto é que eu cheguei a esta hora!”. Os sinópticos narram esta hora do Getsémani em tons muito mais dramáticos!

A lei do “grão de trigo” diz respeito à vida de todos os seres vivos, no entanto temos dificuldade em aceitá-la. Gostaríamos de continuar a ser uma flor desabrochada na plenitude da sua beleza, numa eterna primavera. Tendo alcançado o fruto maduro do verão, agarramo-nos à árvore da vida, num esforço desesperado para resistir ao outono e não cair no chão... Mas o objetivo da vida é tornar-se um fruto de outono! “Sentir dentro de si a alma sumarenta do fruto: a mesma doçura, a mesma transparência dourada, a mesma sede de cair. Desprender-se, não por orgulho ou cansaço, mas por excesso de peso e de seiva. Desprender-se como um fruto de outono.... Aprender o “desinteresse” do fruto maduro, a fragilidade da plenitude. Uma gota de piedade, uma emoção de amor fazem transbordar a taça embriagada do outono; o mais pequeno solavanco atira ao chão o fruto inchado de aromas e de sol” (Gustave Thibon, filósofo francês). 

Para a reflexão semanal:
Nesta última semana da Quaresma, peçamos a graça da purificação dos sentidos, especialmente o da visão, talvez repetindo, na oração, o grito de Bartimeu, o cego de Jericó, com a mesma confiança e determinação: “Rabi, faz-me ver de novo!” (Marcos 10,46-52). Só assim poderemos seguir Jesus também nós no caminho para Jerusalém!

P. Manuel João Pereira Correia, mccj
Verona, Março de 2024

O caminho do amor radical e da entrega total a Deus e aos irmãos

“O caminho que Jesus nos aponta é o caminho do amor radical, do dom da vida, da entrega total a Deus e aos irmãos. Este caminho pode parecer, por vezes, um caminho de fracasso, de cruz; pode ser um caminho que nos coloca à margem desses valores que o mundo admira e consagra; pode parecer um caminho de perdedores e de fracos, reservado a quem não tem a coragem de se impor, de vencer a todo o custo, de conquistar o mundo… No entanto, Jesus garante-nos: a vida plena e definitiva nasce do dom de si mesmo, do serviço simples e humilde prestado aos irmãos.”

„Entre os que tinham subido a Jerusalém à Festa para a adoração, havia alguns gregos. Estes foram ter com Filipe, que era de Betsaida da Galileia, e pediam-lhe: «Senhor, nós queremos ver Jesus!». Filipe foi dizer isto a André; André e Filipe foram dizê-lo a Jesus.

Jesus respondeu-lhes: «Chegou a hora de se revelar a glória do Filho do Homem. Em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto. Quem se ama a si mesmo, perde-se; quem se despreza a si mesmo, neste mundo, assegura para si a vida eterna. Se alguém me serve, que me siga, e onde Eu estiver, aí estará também o meu servo. Se alguém me servir, o Pai há-de honrá-lo.

Agora a minha alma está perturbada. E que hei-de Eu dizer? Pai, salva-me desta hora? Mas precisamente para esta hora é que Eu vim! Pai, manifesta a tua glória!» Veio, então, uma voz do Céu: «Já a manifestei e voltarei a manifestá-la!»

Entre as pessoas presentes, que escutaram, uns diziam que tinha sido um trovão; outros diziam: «Foi um Anjo que lhe falou!»

Jesus respondeu: «Esta voz não veio por causa de mim, mas por amor de vós. Agora é o julgamento deste mundo; agora é que o dominador deste mundo vai ser lançado fora. E Eu, quando for erguido da terra, atrairei todos a mim.»

Dizia isto dando a entender de que espécie de morte havia de morrer.”