In Pace Christi

Cappelletti Carlo

Cappelletti Carlo
Data de nascimento : 16/12/1919
Local de nascimento : Selva di Progno/Verona
Votos temporários : 07/10/1942
Votos perpétuos : 07/10/1944
Data de ordenação : 29/06/1945
Data da morte : 18/09/2011
Local da morte : Verona/Italia

«O P. Carlo, tal como viveu serenamente, assim serenamente nos deixou, quando os sinos da cidade de Verona assinalavam a hora do Angelus». São as palavras iniciais da homilia que o P. Aleardo De Berti proferiu no funeral.

Nascido em Selva de Progno a 16 de Dezembro de 1919, frequentou o ensino primário e secundário no seminário episcopal de Verona. Em 1940 pediu para deixar o seminário diocesano para entrar no noviciado comboniano de Venegono. Depois de dois anos de noviciado fez os votos temporários e a 29 de Junho de 1945, no final da segunda guerra mundial, foi ordenado sacerdote: o seu caminho formativo missionário desenvolveu-se todo ele durante os cinco anos de guerra.

Depois da ordenação, trabalhou na Casa Mãe como encarregado do ministério em S. Tomio e angariador de ajudas para a casa de Pádua. Depois de alguns meses na Inglaterra para o estudo do inglês, em Julho de 1947 iniciou a sua longa vida missionária partindo para Cartum, o seu baptismo de fogo. Foi mandado, de facto, para o Comboni College para ensinar estenografia e história civil europeia. Tratava-se de matérias que não conhecia – «o caro P. Stellato dá-me lições de estenografia» – mas tinha aceitado obviamente por «obediência cega», exigida naqueles anos, que porém não produziu o milagre! O jovem missionário entrou numa crise profunda, depois bem superada com a ajuda de um superior compreensivo e inteligente.

Em Maio de 1952 voltou para Itália para um breve período de descanso e depois, em Novembro do mesmo ano, foi destinado ao Uganda, onde permaneceu durante vinte e dois anos (1952-1974) e onde pôde realizar-se mais serenamente no apostolado e no ministério ordinário servindo várias comunidades eclesiais e religiosas na diocese de Gulu primeiro e depois de Arua, tornando-se um bom conhecedor das línguas locais.

A sua primeira missão (de Dezembro de 1952 a Dezembro de 1955), na diocese de Gulu, foi Kalongo, entre os Acholi. Anos mais tarde descrevia--a assim: «Muitas capelas espalhadas por uma vasta superfície dão-me a oportunidade de ganhar prática na visita às povoações. Na missão, naqueles anos, iniciavam-se os trabalhos que em pouco tempo fariam de Kalongo o centro assistencial que todos conhecem».

No final de 1955 foi para Nyapea, entre os Alur. Seguimos de novo as suas palavras: «Grandes grupos de catecúmenos, baptismos, primeiras comunhões, casamentos não têm conta. O velho e bom P. Domenico Spazian, encarregado do registo paroquial, diz que não dá mais vazão».

Em 1957, tendo passado para a diocese de Arua, trabalhou durante mais de cinco anos entre os Jonam, uma população da zona de Pakwach sobre o Nilo infestado se melgas, a tal ponto que nas laudes de domingo, no Cântico em que se convidam todas as criaturas a louvar o Senhor, o P. Carlo acrescentava: «Melgas todas do rio, bendizei o Senhor».

Em Outubro de 1962 voltou para Itália para um ano de férias que passou ajudando no ministério em S. Tomio e durante alguns meses em Carraia.
Em Outubro de 1963 foi mandado para Warr por oito meses. Em 1964 passou para Paidha, uma missão nos inícios, onde «os cristãos seguem com entusiasmo» os missionários. Entretanto, no vizinho Congo alastrava a guerra civil que sacudiu também o West Nile e no Sul do Sudão os Combonianos eram expulsos. Naquela ocasião o P. Carlo escreveu ao Superior Geral, P. Gaetano Briani, para expressar a sua comparticipação na dor da provação que os confrades expulsos tiveram de aguentar. Seguiram-se, a 15 de Janeiro de 1967, as expulsões de cinco confrades da diocese de Arua e cinco de Gulu. O P. Carlo teve de passar de Paidha para Nyapea para ocupar o lugar que ficara vazio. Trabalhou também nas missões de Orussi e de Arua-Ediofe.

No trabalho missionário o P. Carlo sempre se empenhou com grande humildade e seriedade. No seu dossier pessoal, não há muitas notícias e mesmo depois de ter regressado da missão, nos muitos anos que passará em Verona, nunca falou muito dos seus anos no Uganda. Podemos recordar que, em obséquio ao bispo, tentou a fundação de uma capela nas margens do lago Vitória a favor dos muitos pescadores que, do ponto de vista espiritual, eram bastante esquecidos. Com os confrades de missão, o P. Carlo sempre manteve relações cordiais e ficaram proverbiais a sua «vivacidade» e a alegria contagiante.

Destinado a Itália, de 1975 a 2003 permaneceu em Verona, na Reitoria de S. Tomio. Para descrever este período, transcrevemos parte da homilia do P. De Berti: «Por mais de vinte e sete anos foi “confessor” incansável de fiéis leigos e consagrados. Quase 50 por cento da sua vida “activa” sacerdotal e missionária foi consagrada exclusivamente ao ministério do sacramento da reconciliação. Quem viveu com o P. Carlo, partilhando o mesmo ministério sacerdotal, pode honestamente referir também a ele o ditado, talvez um pouco pretensioso “se é martírio confessar Cristo diante dos homens, é outro tanto martírio confessar homens e mulheres diante de Deus”.

Em Verona, de facto, o P. Carlo era conhecido como homem capaz de ouvir, paciente até ao heroísmo, sábio no discernimento, compreensivo quanto aos problemas espirituais complexos, determinado nas decisões e nas soluções a tomar e firme na orientação. Teve penitentes com grandes responsabilidades civis e religiosas.

Em comunidade estava sempre de bom humor, excelente contador de histórias (verdadeiras, inventadas ou empoladas) para manter alegre a pequena comunidade. Gostava de falar de Serra de Progno, sua terra natal, dos seus vales e dos seus antigos habitantes, os Cimbros. Deliciava-se em ver-nos felizes. Com ele soltavam-se grandes risadas. Por vezes, se estava ausente, reinava um silêncio monástico!

No último lanço de vida missionária, 2003-2011, é preciso recordar a sua transferência de S. Tomio, onde era quase considerado como “peça mobiliária”, para a enfermaria da Casa Mãe. Ali, a doença e a idade avançada exigiram uma forma diferente de viver a vida missionária.

O P. Carlo, na Casa Mãe, sofreu mais interiormente que fisicamente. A sua situação pessoal e o ambiente de sofrimento vivido pelos seus confrades doentes fizeram emergir nele uma forte emotividade, muitas vezes incontrolável. Depois, lentamente adaptou-se, aceitou a cruz, resignou-se ao desígnio de Deus, mas perdeu a sua vivacidade e o seu lado humorístico de outros tempos; apreciava a solidão, era silencioso e rezava aguardando o desfeixo final.

Quero recordar o nosso último encontro, sábado à tarde, 17 de setembro 2011. O P. Carlo bisbilhotou-me com nitidez: “eu sou o P. Carlo Cappelletti”. Olhámo-nos nos olhos com um prolongado sorriso. Foi a saudação da despedida. Interpretei aquele gesto, nunca antes feito, como humorístico, mas era um sinal».