Nascido em 1917 em Florença, numa família numerosa e profundamente cristã, o P. Giuseppe Furlanetto entrou ainda miúdo no seminário diocesano de Pordenone. A visita do jovem sacerdote missionário comboniano P. Angelo Tarantino (ex-seminarista de Pordenone e mais tarde bispo de Arua, Uganda), despertou nele a vocação missionária. Assim, aos 18 anos, Giuseppe entrou para os Combonianos e em 1943 foi ordenado sacerdote. Depois de alguns anos como professor no seminário comboniano de Pádua, em 1949 pôde partir para a missão no Sul do Sudão.
«Na Prefeitura Apostólica de Mupoi no Sudão Meridional, entre os Azande, foram anos inesquecíveis. Era, aquela, a vida missionária que sempre sonhara: habitar numa casa coberta de palha, comer coisas simples preparadas por um cozinheiro local. Um dia queixei-me porque a comida estava demasiado salgada e ele: “não é culpa minha: é o sal que é salgado”. Viajar pela floresta a pé, em bicicleta, em mota, visitando os cristãos e os catecúmenos nas capelas e escolinhas espalhadas na savana. Também tive medo quando – o que acontece frequentemente – encontrava os elefantes ou os leões».
O P. Giuseppe trabalhou principalmente nas missões de Nzara e de Ezo, onde «o povo Azande era muito aberto ao evangelho, verdadeiramente desejoso de conhecer o Senhor… No Natal de 1954, vi diante de mim uma maré de cabeças negras inclinadas em devota escuta: vi o deputado católico Cosma Rabale, o grande chefe Diko, os sub-chefes e todos os funcionários estatais. Estando só, não pude contentar todos: alguns vieram confessar-se depois do Natal, outros voltaram para casa sem receber os sacramentos».
Quando parecia que tudo procedia bem, a perseguição abateu-se também sobre esta missão; assim a experiência do P. Giuseppe terminou demasiado depressa. Em 1956 o Sudão tornou-se independente. O regime muçulmano iniciou de imediato a perseguição contra os cristãos. «Para os árabes, política e religião identificam-se, por isso uma pessoa não podia ser um bom sudanês se não fosse muçulmano. O sistema opressor provocou a rebelião de diversas tribos africanas. A reacção do governo de Cartum foi violenta. Em 1957, o sacerdote africano Gabriele Duatuka, que estava na mesma missão comigo, foi preso e torturado. Acompanhei-o até às prisões de Yambio e no dia seguinte, com o corajoso bispo Mons. Ferrara, conseguimos libertá-lo». Em 1958 o P. Giuseppe, porém, foi processado com outros dois padres e depois expulso do Sudão. Em 1964 foi a expulsão de todos os missionários do Sudão meridional, 300 pessoas entre missionários e religiosas.
O P. Giuseppe foi de imediato destinado ao Brasil, onde permaneceu durante 42 anos. «Os Combonianos tinham chegado à América Latina em 1951. O primeiro a chegar ao Brasil foi o P. Rino Carlesi, que veio a ser depois bispo de Balsas. A vinda dos missionários tinha dois objectivos: ajudar o clero local, muito escasso, na obra de re-evangelização (a maior parte das pessoas só tinham recebido o baptismo); segundo: criar um espírito missionário nas renovadas comunidades cristãs, especialmente por meio das Comunidades Eclesiais de Base (CEB). Eu cheguei só em 1959».
Trabalhou durante os primeiros quinze anos na diocese de São Mateus, estado do Espírito Santo. Logo que chegou, teve a alegria de participar na “tomada de posse” do primeiro bispo da nova diocese, Mons. Giuseppe Dalvit, comboniano. «Sentia uma grande saudade da África onde – devo dizer a verdade – deixei um pedaço do coração. Mas quase de imediato a cordialidade dos brasileiros me cicatrizou a ferida. Visitava as comunidades num raio de 60-80 quilómetros. Ia a cavalo. Só mais tarde conseguimos um jeep, carro apropriado às estradas lamacentas e difíceis do lugar. A hospitalidade afectuosa e delicada das famílias era comovente. Repetiam muitas vezes, como um refrão: “Somos pobres, mas não da graça de Deus”. Sentia-me missionário realizado. Vivia, criava amizades, reunia as crianças para o catecismo (a catequese sempre foi a minha paixão) e depois havia o encontro afectivo com o povo para a Missa. Prioridade pastoral da diocese era a formação dos animadores de comunidades e a criação das comunidades de base, que ajudavam a gente a resolver também os graves problemas sociais, os da terra, para nos entendermos».
Conta quando era vice pároco em Mantenópolis (1961): «”Na nossa paróquia, em sete meses tivemos quase dez assassínios”, lamentava-me com um amigo. “Eu bem dizia”, exclamou aquele, “desde quando vós, Combonianos, estais aqui a situação melhorou a cem por cento! Antes, na pequena cidade, aconteciam crimes quase diariamente. Agora, graças a Deus, não é mais assim”».
O P. Giuseppe trabalhou também na região amazónica. Entre 1975 e 1985, de facto, permaneceu na Rondónia, primeiro em Ouro Preto e depois em Espigão. Foi um trabalho pioneiro, missionário a cem por cento, com viagens intermináveis a pé e a cavalo ou com o carro naquelas estradas lamacentas, acabadas de abrir no coração da floresta. «O encontro festivo com as pobres famílias dos camponeses era motivo de profunda alegria e gratidão a Deus por me ter chamado a uma obra tão bela como é a edificação do Reino de Deus». Graças também à colaboração de tantas famílias cristãs chegadas à procura de terra, foi possível aos Combonianos instaurar na nova diocese de Ji Paraná uma pastoral avançada que serviu de modelo no desenvolvimento seguinte da diocese.
Por causa de um problema na vista que não lhe permitia mais conduzir, em 1985 o P. Giuseppe pediu aos superiores para trabalhar em alguma periferia da cidade onde pudesse encontrar muita gente sem grandes deslocações. Assim chegou a Taguatinga, uma cidade de 400.000 habitantes, perto de Brasília. A sua principal actividade era a catequese, não só a nível paroquial (crianças, adolescentes, adultos) mas também a nível diocesano, na formação dos catequistas e dos dirigentes mediante cursos de actualização e de espiritualidade. «Agora preparo para a primeira comunhão, para o crisma e o baptismo crianças e adultos e depois dedico-me à pastoral dos enfermos, visitando regularmente os doentes no hospital ou nas suas casas. A nossa paróquia da Sagrada Família é um centro de espiritualidade com participação altíssima nas missas e nos sacramentos, mesmo nos dias de semana. Há muitos jovens e isso faz nos ter confiança no futuro. Além disso, a missionação traduz-se em caridade. Temos as cantinas dos pobres. Todos os dias, grupos de leigos, por turnos, preparam grandes panelas de sopa com arroz, massa e carne, e vão aos vários bairros matar a fome a quem não tem nada».
Perto do final de 2000, o P. Giuseppe voltou para Itália para tratamentos e foi quase de imediato destinado à província italiana. Permaneceu quase sempre em Arco, até quando em Janeiro de 2013 foi mandado para Verona, para o Centro de Doentes. Aqui faleceu a 22 de Dezembro de 2013. O funeral realizou-se quarta-feira, dia 24 de Dezembro, na capela do Bom Pastor na Casa Mãe. Foi sepultado no cemitério monumental de Verona.