Sábado, 23 de Agosto de 2025
Estamos todos convidados a participar nesta campanha, com vista à COP30, para pressionar os governos de todo o mundo a tomarem medidas climáticas eficazes, à escala global e atempadas. A campanha continuará durante todo o Tempo da Criação (1 de setembro a 4 de outubro de 2025) e, como combonianos, assumimo-la como um compromisso jubilar concreto. [Ver anexos]
UM COMPROMISSO JUBILAR COMBONIANO
A campanha pela justiça climática dos Institutos religiosos
Introdução
Começamos esta apresentação com algumas considerações carismáticas sobre três eventos históricos:
1. O ano de 2024, o mais quente já registado a nível global, marcou uma etapa significativa na crise climática. Foi o primeiro ano civil em que a temperatura média global ultrapassou em 1,5 °C o nível pré-industrial, um limite que o Acordo de Paris (2015) sobre o clima pretendia não ultrapassar. Janeiro de 2025 intensificou ainda mais esta tendência, registando o mês mais quente de sempre. A urgência da crise do aquecimento global não pode ser subestimada. Estamos a assistir a impactos cada vez mais graves, que afetam particularmente as pessoas de baixa e média renda, tanto nos países em desenvolvimento como nos desenvolvidos. O clamor da terra e o clamor dos pobres chegam-nos cada vez mais fortes. Em particular, como missionários combonianos, herdeiros da sensibilidade e do carisma de São Daniel Comboni, sentimo-nos interpelados por este clamor.
2. A COP30 é a conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas prevista para novembro de 2025 em Belém (Brasil). A presidência da COP30 convida a comunidade internacional a unir-se num “mutirão” global (uma prática ancestral de colaboração coletiva para realizar uma tarefa comum) contra as alterações climáticas, num esforço partilhado entre os povos para o progresso da humanidade. A COP30 pode representar um ponto de viragem na ação climática, guiada pelo princípio da justiça climática, rompendo com as tendências atuais que estão a conduzir o mundo para um abismo. O carisma comboniano é particularmente sensível às instâncias de libertação integral (RV 61), assumindo um serviço de evangelização que se empenha na libertação do pecado, também do pecado social cristalizado em estruturas opressivas e tendências destrutivas, como aquelas que a COP se propõe a superar.
3. Este ano de 2025 celebramos um Jubileu ordinário que coloca a Esperança no centro. Em primeiro lugar, encontramos esperança na graça de Deus, que experimentamos através da Sua misericórdia e do Seu perdão. Mas também somos chamados a descobrir a esperança respondendo à injustiça eco-social. Por exemplo, Spes non confundit – “A esperança não engana”, a Bula de convocação do Jubileu de 2025 – lança alguns apelos específicos:
= tomar medidas concretas para erradicar a fome, um verdadeiro escândalo para a humanidade;
= a dívida ecológica das nações mais ricas exige o reconhecimento da gravidade de muitas das suas decisões passadas e a determinação de perdoar as dívidas dos países que nunca poderão pagá-las. Mais do que uma questão de generosidade, trata-se de justiça, considerando os desequilíbrios comerciais com efeitos sobre o ambiente e o uso desproporcionado dos recursos naturais por parte de alguns países ao longo do tempo.
O Jubileu convida-nos a efetuar reparações, a preparar um caminho de paz no nosso mundo. Trata-se de um apelo para nos empenharmos em remediar as causas profundas da injustiça, saldar dívidas injustas e impagáveis e alimentar os famintos. (SNC 16)
Ao longo de todo o seu ministério, São Daniel Comboni entendeu o anúncio do Evangelho como uma força de libertação do pecado e das estruturas do pecado, como por exemplo a escravatura e o tráfico de seres humanos. Foi uma voz profética, empenhada sem reservas na defesa da humanidade africana e dos direitos humanos, apelando também às mais altas autoridades civis e políticas do seu tempo. Com saudável realismo, ele percebeu que não basta libertar os escravos, mas é preciso, ao mesmo tempo, construir uma sociedade alternativa, mais justa, fraterna e sustentável – como testemunha a experiência da comunidade agrícola de Malbes –, caso contrário, a liberdade conquistada acaba por se perder rapidamente.
Na situação do seu tempo, São Daniel Comboni soube fazer causa comum com os povos da África, nas aflições causadas pela seca e pela fome, bem como pela perda da liberdade e pelo tráfico de escravos. Não poupou esforços e empenhou-se em todas as frentes para defender a causa da justiça social e da dignidade da África, com apelos às mais altas autoridades do seu tempo. Comboni denunciou tanto o sistema escravista do tráfico oriental quanto as ambições coloniais europeias, que em nome da “civilização” impunham o seu domínio sobre a África. Ele, ao contrário, viveu para promover uma civilização diferente, ou seja, a “civilização do amor”, que nasce do Evangelho e que floresceria através da regeneração da África com a África.
Como podemos nós, hoje, permanecer indiferentes ao que está a acontecer no mundo?
O apelo do jubileu bíblico
O jubileu de 2025 convida-nos a ser peregrinos de esperança, assumindo também os grandes desafios do nosso tempo para encontrar respostas que anunciem a todos a boa nova do Reino que vem. Se olharmos para as exigências do jubileu bíblico, encontraremos orientação e inspiração sobre como transformar a esperança em ação dentro do atual sistema mundial.
A tradição bíblica do Jubileu convida o povo de Deus à conversão através do restabelecimento de relações justas e de uma sociedade igualitária, na qual a dignidade humana e a fraternidade sejam respeitadas e promovidas. Em particular, previa:
= Descanso da terra (Lv 25, 11): isso significava libertação dos sistemas de acumulação e exploração, promovendo ao mesmo tempo a partilha do que a providência divina oferece para as necessidades fundamentais de todos. Quando o pouco que há é partilhado, há o suficiente para todos.
= Restituição da terra (Lev 25, 10; 13): as propriedades que tinham sido vendidas ou transferidas eram devolvidas aos seus proprietários originais, garantindo que as famílias mantivessem a sua fonte de sustento e a sua identidade sociocultural.
= Libertação dos escravos (Lev 25, 10): aqueles que se venderam como escravos por causa das dívidas eram libertados, reafirmando a dignidade e a liberdade de cada pessoa e apelando à fraternidade numa sociedade igualitária.
= Remissão das dívidas (Dt 15, 1-3): em conexão com o ano sabático – o ano da remissão – contextualizado ao jubileu, havia a anulação das dívidas, permitindo que aqueles que haviam caído na pobreza recomeçassem sem a opressão das obrigações financeiras; aliás, os credores não podiam deixá-los livres de mãos vazias, mas deviam dar-lhes o necessário para recomeçar (Dt 15, 13-14). Isto sublinhava a importância da misericórdia e da solidariedade, oferecendo a todos uma possibilidade de um novo começo.
Essas medidas não eram apenas de natureza económica, mas traziam consigo um profundo significado teológico: Deus como único verdadeiro proprietário da terra e libertador do Seu povo. Em última análise, tratava-se de regressar ao sonho de Deus para a humanidade; um sonho do qual a humanidade se afasta quando constrói uma sociedade baseada na acumulação de riquezas e recursos, na dominação e na violência contra os outros, muitas vezes mascaradas por justificações religiosas. Pelo contrário, o Jubileu imagina uma sociedade alternativa baseada na partilha, no serviço, na não violência e numa relação com Deus que ouve o clamor dos pobres.
O jubileu dos peregrinos da esperança e a missão evangelizadora
O Jubileu apresenta-se como uma ocasião privilegiada para relançar com força a missão evangelizadora da Igreja num tempo marcado por crises globais, desorientação cultural e sede de sentido. Num mundo atravessado por guerras, desigualdades e inseguranças existenciais, a esperança cristã torna-se um anúncio profético, capaz de falar ao coração da humanidade. Não se trata de um otimismo vago, mas de uma certeza fundada na presença do Ressuscitado, que continua a operar na história e a transformar vidas. A dimensão jubilar, desde as suas origens bíblicas, está ligada ao tema da libertação, do perdão e da possibilidade de recomeçar. Neste sentido, o Jubileu não é apenas celebração, mas um tempo favorável para proclamar a boa nova e tornar visível a misericórdia de Deus.
O Jubileu, portanto, representa uma oportunidade para envolver todo o povo de Deus num renovado impulso missionário. Não se limita a Roma, mas convida cada comunidade local a tornar-se um lugar de esperança, ativando caminhos de encontro, evangelização e transformação social.
A força simbólica do Jubileu pode atrair também aqueles que estão longe da fé: os temas fundamentais da restituição da terra e do descanso, da libertação de todas as formas de escravidão económica e produtiva e da remissão das dívidas são de grande atualidade e relevância para os pobres e excluídos em todo o mundo, e podem tornar-se portas através das quais a Igreja oferece uma proposta de sentido acessível e credível. Numa época que corre o risco do cinismo e da resignação, o Jubileu convida a Igreja a anunciar, com humildade e coragem, que a esperança é possível – e tem um nome: Jesus Cristo.
O sonho do XIX Capítulo Geral dialoga intensamente com tudo isto: “Sonhamos um estilo missionário mais inserido na realidade dos povos que acompanhamos rumo ao Reino, capaz de responder ao grito da Terra e dos empobrecidos” (AC 2022, 28), a ser realizado – em resposta aos desafios da mudança de época que vivemos e à luz da Palavra de Deus – assumindo a Ecologia Integral como um eixo fundamental da nossa missão (AC 2022, 30).
A importância do jubileu no atual cenário geopolítico
Hoje, o mundo enfrenta uma “policrise”, ou seja, a presença simultânea de várias crises que se influenciam mutuamente. Por um lado, por exemplo, há a crise climática, com impactos devastadores; por outro, estamos numa situação que o Papa Francisco definiu como uma Terceira Guerra Mundial em pedaços. Parece não haver mais nenhuma linha vermelha capaz de conter os conflitos, e a corrida aos armamentos atingiu níveis sem precedentes, gerando novas dívidas e desviando recursos dos serviços sociais e das ações de mitigação, adaptação e reparação em relação às alterações climáticas. A abordagem multilateral e diplomática para a resolução de problemas e conflitos globais está em declínio, e o mundo entrou numa fase em que prevalece a lógica de apelar ao “direito da força” – em vez da força do direito (FT 174) – da aniquilação e da impunidade. Os direitos humanos e dos povos são negligenciados ou violados, e as desigualdades continuam a aumentar devido a estruturas económicas injustas, empurrando cada vez mais pessoas para baixo do limiar da pobreza e o planeta para além da sua capacidade regenerativa.
Neste contexto, o apelo do Jubileu bíblico é mais atual e significativo do que nunca: é um apelo à reparação de um sistema socioeconómico e político injusto, insustentável e marcado pelo pecado. Laudate Deum invocou uma peregrinação de reconciliação com o mundo que é a nossa casa (LD 69), para construir a paz com a Criação e entre os povos.
Transformar a esperança em ação no mundo de hoje
Quando falamos de mudança sistémica, queremos dizer uma transformação radical das estruturas sociais e da mentalidade, ou da cultura, que as sustenta. Não devemos desanimar com a magnitude e complexidade da luta contra a crise que estamos a viver, com resultados abaixo das expectativas. Já a Laudate Deum (LD 36) tinha observado que
É lamentável que as crises globais sejam desperdiçadas quando poderiam ser uma ocasião para introduzir mudanças salutares. Assim sucedeu na crise financeira de 2007-2008 e voltou a acontecer na crise da Covid-19.
E ainda
Para se obter um progresso sólido e duradouro, quero insistir que “ há que favorecer os acordos multilaterais entre os Estados» (LD 34).
É verdade que, nos últimos anos, a abordagem multilateral chegou à paralisia e, portanto, o desafio atual é reconfigurá-la e recriá-la, levando em consideração a nova situação do mundo.
Apesar de todas as suas limitações e defeitos, ainda há um lugar onde essa reconfiguração é possível, ou seja, a conferência anual das Partes sobre as alterações climáticas, geralmente chamada pela sua sigla COP. As Partes são os Estados que assinaram os acordos climáticos, como o Acordo de Paris (2015), que atualmente são 197, mais a União Europeia. Todos os anos vemos como o progresso alcançado nessas conferências é lento e dececionante. Os interesses egoístas e conflituosos dos Estados facilmente bloqueiam um processo que se baseia no consenso. Sobretudo, o convidado de pedra é o facto de que, a menos que se mude o atual modelo de desenvolvimento, que se baseia numa economia extrativa que visa maximizar os lucros às custas das realidades sociais e ambientais, não há soluções para a crise climática. Então, o desafio atual é, como afirma a Laudate Deum, reconfigurar e recriar este espaço (LD 37). O Papa Francisco, de facto, defendeu um novo modelo de multilateralismo que reconheça que “muitos grupos e organizações da sociedade civil ajudam a compensar as desabilidades da Comunidade internacional, a sua falta de coordenação em situações complexas, a sua carência de atenção relativamente a direitos humanos fundamentais” (LD 37). As organizações da sociedade civil e os povos indígenas já podem participar como observadores nas COP. As congregações religiosas são chamadas a acompanhá-los nesse caminho, defendendo a causa da justiça climática. E, dado que tudo está interligado, como afirma repetidamente a encíclica Laudato si', quando os povos indígenas, a sociedade civil e as organizações de inspiração religiosa enfrentam a crise climática nas COP, eles também associam a essa crise a crise socioeconómica e os conflitos que estão a devastar sociedades e ecossistemas.
O apelo pela justiça climática e pela casa comum
A crise climática – como já mencionado no início – atingiu um ponto perigoso, alimentada pelo aquecimento global. Em 2024, a temperatura média da Terra ultrapassou em 1,5 °C os níveis pré-industriais – o limite estabelecido pelo Acordo de Paris (2015) para evitar os impactos climáticos mais graves. Populações em todo o mundo, especialmente as mais pobres e vulneráveis, já estão a sofrer com ondas de calor extremas, inundações e secas cada vez mais frequentes.
Inspiradas tanto pela Laudato si' quanto pelo apelo do Papa Leão XIV para viver uma ecologia integral com justiça, as conferências/conselhos episcopais da África, Ásia, América Latina e Caraíbas (CCEAAAL) divulgaram uma mensagem por ocasião da COP30, dirigida aos líderes governamentais, exortando-os a trabalhar para uma implementação ambiciosa do Acordo de Paris em benefício das pessoas e do planeta. Eles levantam uma voz profética, invocando a paz através de uma conversão ecológica que transforme o atual modelo de desenvolvimento, baseado no extrativismo, na tecnocracia e na mercantilização da natureza. Em consonância com a posição dos bispos, também as Congregações Religiosas Católicas fazem ouvir a sua voz em favor da justiça climática, pedindo aos governos que ajam com coragem durante o encontro das Nações Unidas sobre o clima que se realizará no Brasil (10 a 21 de novembro de 2025), também conhecida como COP30.
A campanha das Congregações Religiosas para a COP30
Em referência às negociações em curso, as Congregações Religiosas, através da comissão GPIC da Usg e da UISG, apresentam quatro pedidos fundamentais para responder ao grito dos pobres e da Terra em favor da justiça climática:
1. Cancelação das dívidas dos países “que nunca poderão pagá-las” (SNC 16)
Como afirma Spes non confundit – a Bula de Proclamação do Ano Jubilar de 2025 –, trata-se mais de uma questão de justiça do que de generosidade. Este tema é ainda mais urgente hoje em dia devido a uma nova forma de injustiça cada vez mais reconhecida: a existência de uma verdadeira “dívida ecológica”, sobretudo entre o norte e o sul do mundo, ligada a desequilíbrios comerciais com efeitos no ambiente e à utilização desproporcionada dos recursos naturais por parte de alguns países durante longos períodos de tempo.
Os bispos do Sul global convidam à constituição de uma coligação histórica de atores do sul e do norte global, unidos por um compromisso ético e de justiça, para enfrentar a questão da dívida. Portanto, as Congregações Religiosas Católicas, à luz da condição de muitos países pobres presos em dívidas injustas que impedem investimentos na proteção das pessoas contra desastres climáticos, pedem que sejam encontradas formas justas de cancelar essas dívidas, para que possam destinar recursos à saúde, educação e ações climáticas, em vez de ao pagamento do serviço da dívida. Este apelo está em sintonia com o pedido deuteronómico da remissão sabática das dívidas.
2. Reforçar o Fundo para perdas e danos (Loss and Damage Fund)
Trata-se de uma iniciativa concordada na COP27 (Sharm El Sheikh, 2022) para destinar recursos financeiros aos países em desenvolvimento afetados por perdas e danos causados pelas alterações climáticas. Foi reconhecida como uma questão de justiça climática, uma vez que os países que menos contribuíram para as alterações climáticas são frequentemente aqueles que sofrem os impactos mais graves. No ano seguinte, na COP28 (Dubai, 2023), o fundo foi criado com empenhos iniciais de cerca de 700 milhões de dólares, um valor muito longe das necessidades estimadas (que ascendem a muitos milhares de milhões por ano). Como salienta Laudate Deum (2023),
pelo menos produziu um avanço na consolidação do sistema de financiamento pelas “perdas e danos» nos países mais afetados pelas catástrofes climáticas, o que parecia dar nova voz e maior participação aos países em vias de desenvolvimento. Mas também em tal questão ficaram imprecisos muitos pontos, sobretudo a responsabilidade concreta dos países que devem contribuir. (LD 51)
A CCEAAAL pede que os países ricos reconheçam e assumam a sua dívida social e ecológica, como principais responsáveis históricos pela extração de recursos naturais e pela emissão de gases de efeito estufa; e se comprometam com um financiamento climático justo, acessível e eficaz que não gere mais endividamento, a fim de compensar as perdas e danos já existentes no Sul Global.
As alterações climáticas causam perdas e danos que os países pobres não podem evitar. As Congregações Religiosas pedem um fundo para perdas e danos que forneça ajuda financeira rápida, adequada e equitativa, sem criar novas dívidas, para permitir que os países afetados se reconstruam e recuperem. Tudo isto ressoa com o apelo bíblico para restaurar os meios de sobrevivência das pessoas empobrecidas.
3. Estabelecer objetivos para uma transição energética justa
Abandonar os combustíveis fósseis em favor das energias renováveis, como a solar, a eólica e outras fontes sustentáveis, é essencial para um futuro climático seguro. Os combustíveis fósseis são responsáveis por mais de 80% do aquecimento global. Após décadas de negociações sobre o clima, os combustíveis fósseis foram finalmente colocados no centro do debate. No entanto, muitos governos continuam a aprovar novos projetos de carvão, petróleo e gás — colocando em risco a possibilidade de limitar o aquecimento a 1,5 °C.
As Congregações religiosas pedem um plano concreto e vinculativo para pôr fim à expansão de novos projetos de carvão, petróleo e gás e para gerir uma transição global que abandone os combustíveis fósseis. Uma eliminação justa requer um plano justo para reduzir gradualmente a produção existente de combustíveis fósseis, em que os países com maior capacidade e responsabilidade histórica pelas emissões sejam os primeiros a fazer a transição, prestando apoio aos outros no mundo. Os subsídios aos combustíveis fósseis devem cessar, e os Estados devem estabelecer objetivos claros para a transição para as energias renováveis, sem deixar para trás nenhum trabalhador, comunidade ou país. Este apelo está em profunda sintonia com a exigência bíblica do descanso da terra, para garantir a libertação dos sistemas de acumulação e exploração.
Os bispos do sul do mundo também pedem que se pare com qualquer nova expansão da extração de combustíveis fósseis e que se abandone o modelo económico baseado no uso desses combustíveis. Em vez disso, propõem apoiar alternativas energéticas sustentáveis e descentralizadas que respeitem os territórios e as pessoas que historicamente foram sacrificadas. A declaração dos bispos sublinha que
A ideia de uma “transição energética justa”, embora apresentada como solução para a crise ambiental, muitas vezes perpetua o modelo atual, beneficiando grandes corporações e países do Norte Global, enquanto impõe custos desproporcionais ao Sul Global. Os projetos energéticos em vigor frequentemente deslocam comunidades e destroem ecossistemas, agravando desigualdades. Além disso, a crescente retórica de que a solução passa pela expansão da mineração, especialmente para a extração de minerais considerados “críticos” e terras raras, é ecologicamente insustentável, injusta e predatória. Reforça o extrativismo colonial, transforma territórios inteiros em zonas de sacrifício, viola direitos humanos e devasta a natureza em nome de uma falsa sustentabilidade. É urgente romper com um modelo econômico que propõe crescimento infinito em um planeta finito e que, para isso, explora ilimitadamente pessoas e recursos.
Uma transição justa, de facto, deve respeitar os direitos dos povos indígenas e das comunidades locais, muitos dos quais vivem em territórios ancestrais onde ocorre grande parte da extração mineira para fontes de energia limpa. Já a Laudato si' havia alertado sobre essa tendência que leva à degradação ambiental:
Trata-se de “uma forma de compreender a vida e a ação do ser humano que contradiz a realidade até ao ponto de a arruinar”. [LS 101] Em suma, consiste em pensar “como se a realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da tecnologia e da economia”. [LS 105] Como consequência lógica, “daqui se passa facilmente à ideia de um crescimento infinito ou ilimitado, que tanto entusiasmou os economistas, os teóricos da finança e da tecnologia”. [LS 106]. (LD 20)
Em outras palavras, uma transição justa não é apenas uma questão de passar para a energia renovável, mas também de viver dentro dos limites planetários, mudando estilos de vida e modos de produção e consumo. Aqui, o apelo do jubileu bíblico para deixar a terra descansar é totalmente pertinente. A premissa de que a combinação do poder financeiro e da tecnologia pode resolver todos os problemas e gerar lucros – sem questionar o modelo de desenvolvimento fundamentalmente errado que criou a crise climática, com a sua abordagem extrativista e o uso intensivo de combustíveis fósseis (LS 23) – é manifestamente falsa. Como afirma a Laudato si’,
A tecnologia, que, ligada à finança, pretende ser a única solução dos problemas, é incapaz de ver o mistério das múltiplas relações que existem entre as coisas e, por isso, às vezes resolve um problema criando outros. (LS 20)
4. Estabelecer objetivos concretos para desenvolver um sistema global de soberania alimentar baseado em práticas agroecológicas
A agricultura industrial prejudica a natureza e o clima. As Congregações religiosas pedem que se apoie os pequenos e médios agricultores — em particular as mulheres — que praticam a agroecologia. Isso contribuirá para criar sistemas alimentares sustentáveis que protejam o ambiente e forneçam alimentos saudáveis, promovendo métodos de produção, transformação, distribuição e consumo alimentar culturalmente adaptados.
Tudo isso está em sintonia com o apoio dos bispos do sul do mundo à agricultura familiar, que representa a maior parte da produção alimentar nos seus países. Os bispos insistem para que o trabalho de milhões de famílias seja protegido e promovido, incentivando a cooperação na gestão sustentável da água e do solo e dando prioridade à recuperação de terras degradadas.
Este apelo está em profunda ressonância com os apelos do Jubileu bíblico à restituição da terra e à libertação do trabalho escravizante, que hoje se manifesta em formas de relações laborais exploradoras, que mantêm reféns pessoas sem meios próprios de subsistência.
A Laudato si' também defende vigorosamente sistemas agrícolas sustentáveis, em pequena escala e diversificados, que respeitem a natureza e promovam a justiça para os pobres. Critica o modelo industrial dominante da agricultura pelos seus impactos ambientais e sociais. Esta crítica está em consonância com a oposição da agroecologia às monoculturas, à dependência de aditivos químicos e ao domínio das grandes empresas agroalimentares. A encíclica também afirma a importância da agricultura familiar e dos conhecimentos tradicionais, que são fundamentais para as práticas agroecológicas:
Para se conseguir continuar a dar emprego, é indispensável promover uma economia que favoreça a diversificação produtiva e a criatividade empresarial. Por exemplo, há uma grande variedade de sistemas alimentares rurais de pequena escala que continuam a alimentar a maior parte da população mundial, utilizando uma porção reduzida de terreno e de água e produzindo menos resíduos, quer em pequenas parcelas agrícolas e hortas, quer na caça e recolha de produtos silvestres, quer na pesca artesanal. As economias de larga escala, especialmente no sector agrícola, acabam por forçar os pequenos agricultores a vender as suas terras ou a abandonar as suas culturas tradicionais. As tentativas feitas por alguns deles no sentido de desenvolverem outras formas de produção, mais diversificadas, resultam inúteis por causa da dificuldade de ter acesso aos mercados regionais e globais, ou porque a infra-estrutura de venda e transporte está ao serviço das grandes empresas. As autoridades têm o direito e a responsabilidade de adoptar medidas de apoio claro e firme aos pequenos produtores e à diversificação da produção. [LS 129]
Como participar na campanha
Estamos todos convidados a participar nesta campanha, com vista à COP30, para pressionar os governos de todo o mundo a tomarem medidas climáticas eficazes, à escala global e atempadas. Para isso, foi lançada uma campanha de recolha de assinaturas online, que tem dois aspectos: a recolha de assinaturas em apoio à declaração dos religiosos para dar visibilidade à nossa posição em relação às intervenções necessárias para enfrentar a crise climática; e o envio da declaração aos negociadores do seu país, para pressionar para que o bem comum prevaleça sobre os interesses egoístas. Sem um forte impulso da base, é difícil que a COP possa produzir resultados à altura da situação.
A campanha continuará durante todo o Tempo da Criação (1 de setembro a 4 de outubro) e, como combonianos, assumimo-la como um compromisso jubilar concreto.
Participar é muito simples: através do link https://www.ecojesuit.com/ndcs-for-cop30/ acede-se a uma interface onde se fornecem os seus dados pessoais, assinando assim a petição e indicando a que governo enviá-la.
Conclusão
Estes apelos estão intimamente relacionados com as negociações que terão lugar na COP30 em Belém (10-21 de novembro de 2025). As Congregações religiosas, inspiradas pelo magistério social da Igreja, convidam todas as pessoas de boa vontade – outros grupos religiosos e comunidades, sociedade civil, indivíduos – a unirem-se a esta campanha pela justiça climática. Juntos, os nossos esforços compartilhados podem contribuir para proteger o nosso planeta, defender os mais vulneráveis e garantir esperança para o futuro das gerações vindouras. Como declarou o Papa Francisco no final da Laudate Deum (LD 60):
Oxalá que, a intervir na COP28, sejam estrategas capazes de pensar mais no bem comum e no futuro dos seus filhos, do que nos interesses contingentes de algum país ou empresa. Possam assim mostrar a nobreza da política, e não a sua vergonha. Aos poderosos, atrevo-me a repetir esta pergunta: “Para que se quer preservar hoje um poder que será recordado pela sua incapacidade de intervir quando era urgente e necessário fazê-lo?”
Ir. Alberto Parise MCCJ
Secretariado Geral da Missão
Roma